A presente exposição, de Juca Fiis (Rio de Janeiro, 1989), abre o programa de projetos expositivos do GLÓRIA – espaço voltado para livros e publicações de arte e pensamento contemporâneo, para consulta e pesquisa dos diferentes agentes do circuito. Se na primeira sala estamos diante deste acervo de publicações que cresce ao passo em que doações e aquisições são feitas, na sala adjacente são realizados projetos de artistas de diferentes gerações, origens e práticas, que ocuparão este espaço com projetos inéditos, pensados e comissionados especialmente para o/a GLÓRIA.
Em nossa exposição inaugural, Juca Fiis apresenta sua produção recente de trabalhos realizados em torno do tema da coragem do milho de virar pipoca. Juca já realizou trabalhos como oficinas e laboratórios que resultaram em obras coletivas em territórios públicos da cidade, com parcerias com o Ateliê Azulejaria e a ONG Redes da Maré, baseada no Complexo da Maré, na Zona Norte da cidade. Nestes trabalhos, Juca busca instaurar metodologias e práticas colaborativas que articulam o campo da educação, do fazer artístico e da reivindicação do direito ao espaço urbano. Para realizar estes trabalhos em coletivo – e, em geral, em grande escala – foi no próprio Ateliê Azulejaria que o artista encontra um espaço de experimentação para desenvolver uma prática autoral, em que experimenta diferentes tipos de esmaltes e a queima em fornos de cerâmica, mantendo o azulejo e o fazer cidade em escala 1:1 como ponto de partida.
Notadamente, ao longo dos séculos, a tradição da azulejaria exerceu um papel histórico em transportar histórias, narrativas, signos e símbolos de diferentes povos e civilizações, da antiguidade aos dias de hoje, atravessando tanto espaços públicos, quanto íntimos. Se a superfície plana de um azulejo industrial aparenta, à primeira vista, ser uma superfície rasa e asséptica, o trabalho de Juca Fiis nos revela práticas, possibilidades e manipulações dos materiais que atingem resultados insuspeitados, cromaticamente pulsantes, curiosamente forjados. Obras que guardam, em si, a força colaborativa da prática do ateliê, da relação entre público e privado, da experiência do artista com suas oficinas com crianças, de um método colaborativo que chega mesmo até a negociar com agentes como, por exemplo, o próprio fogo. Afinal, é ele que, no processo da queima das peças em cerâmica, devolve ao artista um resultado que, apesar de que minimamente planejado a priori, foge ao controle de qualquer desejo cartesiano de criação – uma sensação familiar com a explosão e deformação da própria pipoca.
É nesta linha desviante, nesta espécie de contramão de um estado natural e equilibrado das coisas e das realizações, que abrimos também hoje ao público nosso espaço multidisciplinar – GLÓRIA. São métodos horizontais e colaborativos como o da produção artística de Juca Fiis que nos inspiram e seguirão a nos conduzir a sedimentar um projeto que busca fomentar projetos expositivos e, sobretudo, solidificar-se como uma crescente biblioteca e acervo público de livros de arte e pensamento contemporâneo que se colocam à disposição dos mais distintos agentes do circuito da arte – e de fora dele, também. Em consonância, a exposição de Fiis e nosso acervo aberto ao público, reafirmam este compromisso com uma forma mais democrática, possível e, mais uma vez, baseada no coletivo, para criar e inaugurar um novo espaço artístico na cidade.
por Victor Gorgulho e Anna Pitthan